DÍZIMO NO CONTEXTO DA GRAÇA NEOTESTAMENTÁRIA

POR ESCRITOR ÉZIO LUIZ
Desconstrução de um dogma religioso equivocado

“Porque, mudando-se o sacerdócio, necessariamente se faz também mudança da lei.” (Hebreus 7: 12)

Pontilhar algumas considerações sobre o “dízimo” implica, não só, em palmilhar ousadamente sobre terreno aridamente perigoso com repercussões eclesiásticas inimagináveis, suscetíveis de “apedrejamento”, como, de outro ângulo, se torna necessário para um entendimento sério à luz do contexto do tecido bíblico, sobretudo do campo neotestamentário no qual está plantado, enfaticamente, o Cristianismo, como uma pequena contribuição e esclarecimento nos estudos bíblicos.

Esta abordagem, diferentemente de outras tantas (muitas das quais tendenciosas e de conveniências financeiras), revela a natureza bíblica, sem interpretações “forçadas”, mercê da isenção, independência e neutralidade do escritor ora investigador, haja vista possuir cargo público desvinculado de denominações eclesiásticas, o que leva o texto a uma credibilidade maior. Essa justificativa é tão importante quanto a investigação epistemológica no universo teológico, em si de cunho reflexivo, que ora se traz a público.

Com efeito, não se pode perder de vista, numa investigação bíblica contextual, que o tema deve ser abordado em três momentos históricos, tais sejam: 1) Período Patriarcal (ênfase em Abraão – Gênesis 14: 17-20), antes da Lei, quando se inaugura a figura do dízimo; 2) Período da Lei (ênfase em Moisés – Levítico 27:30-32 e outros) e 3) Período da Graça (ênfase soberana no Senhor Jesus, com desdobramentos nos ensinamentos apostólicos até aos dias de hoje), cuja aparição se dá apenas seis vezes no NT e todas apontando para a prática do Antigo Testamento. O discernimento está em saber que no período do Cristianismo há uma subdivisão: na época de Cristo e após a sua morte e ressurreição.

Explicação imprescindível: o texto em epígrafe encontrado em Hebreus 7:12 se refere ao advento da Graça no Sacerdócio de Cristo, em confronto com a Lei Mosaica e o sacerdócio levítico, conforme relata a Palavra de Deus, acerca de Cristo: “Tu és sacerdote, segundo a ordem de Melquisedeque” (Hebreus 5:6) e, adiante, no mesmo livro, exclama: “De tanto melhor concerto Jesus foi feito fiador, e, na verdade, aqueles foram feitos sacerdotes em grande número, porque pela morte foram impedidos de permanecer, mas este, porque permanece eternamente, tem um sacerdócio perpétuo” (Hb. 7:22-24). Corroborando esse texto está o versículo 28: “Porque a lei constitui sumos sacerdotes a homens fracos, mas a palavra do juramento, que veio depois da lei, constitui ao Filho, perfeito para sempre” (Hb. 7: 28).

Em retorno ao tema, a proposta aqui lançada como desafio, é o enfoque em o Novo Testamento, base do Cristianismo, razão pela qual os períodos anteriores serão investigados, en passant, apenas para o entendimento em conexidade com o todo, em sua evolução histórica e teológica, daí a ênfase em o Novo Testamento para a aplicabilidade na Igreja Essencial Contemporânea. Eis o desafio do exegeta bíblico, respeitando as linhas doutrinárias em outra direção, o que é salutar para um estudo argumentativo dialético eficaz.

Não se ignora – urge salientar – a linha veterotestamentária, mas far-se-á uma releitura, ou uma reformatação, tal como o Senhor Jesus o fez no episódio do iminente apedrejamento de uma mulher flagrada em adultério (João 8:3-11). Ele não descumpriu a lei; deu-lhe, todavia, nova roupagem, nova feição em releitura graciosa, conforme Hebreus 10:1, evidenciando a misericórdia sobre o juízo. Adiante se verá que Ele substituiu o dízimo “obrigatório” (cuja origem histórica se deu antes da Lei Mosaica) pelas ofertas voluntárias, com uma remodelação da lei em prol do Evangelho, conforme se verá seguidamente.

Nessa perspectiva, ocorre amiúde uma seletividade nociva de tópicos do Antigo Testamento, na qual se adota alguns itens do Antigo Testamento enquanto outros são ignorados, sob o argumento de que se trata do “tempo da lei”, de sorte que essa seletividade é levada a termo por conveniência dos intérpretes e dos interesses das organizações denominacionais. Assim é que, quando não há interesse aplica-se a “abolição da Lei pela Graça”, mas quando for do interesse, diz-se que o texto está “em vigor”, pois Cristo não veio “abolir a Lei”, como o caso do texto encontrado em Malaquias 3: 8-12, no Antigo Testamento, acerca da entrega do dízimo. Isso reclama um aprofundamento para uma solução bíblica razoável, sem desvios doutrinários, para se evitar “dois pesos e duas medidas” e as incoerências doutrinárias que se pregam amiúde.

Entrementes, o que exprime o vocábulo “dízimo”, em seu aspecto etimológico? “Dizimar” (do grego dekatoõ), deriva de dekatos: “décimo”, o que, na voz ativa significa “tomar dízimos de” (Hebreus 7:6 e 9). Apodekatoõ ou apodekateuõ, equivale a “pagar o dízimo (décima parte) ou dizimar”, envolvendo uma ideia de “décima parte”. Expressão encontrada em Mateus 23:23, Lucas 11:42 e Lucas 18:12 (ambos dentro de uma censura de Cristo aos fariseus). Portanto, tanto no hebraico (Antigo Testamento) quanto no grego (Novo Testamento), a expressão traduz num formalismo ortodoxo da “décima parte”. A rigor e no princípio de sua previsão bíblica (Período Patriarcal), o dízimo não recaía sobre dinheiro em espécie, nem era uma exigência; havia espontaneidade (cf. Gênesis 28:22, com Jacó).    

Que a entrega do dízimo tem, atualmente, respaldo legalista no período da Lei Mosaica, não resta dúvida e a ênfase no texto de Malaquias 3:8-12 tem sido um argumento sofista utilizado pela maioria das organizações eclesiásticas para a “cobrança” do dízimo. Resta saber, entretanto, se houve: 1) a revogação expressa; 2) a revogação tácita ou 3) uma substituição pelas “ofertas voluntárias”, apregoada, em releitura e remodelamento, pelo Senhor Jesus, sem o rigorismo do percentual legalista de “dez por cento”, com o advento da Graça Neotestamentária. Adianta-se aqui que esta singela e breve incursão teórica teológica se filia ao terceiro pensamento, numa alteração de sentido, como será aqui demonstrado. Seguidamente, a evolução histórica bíblica.

DÍZIMO NO PERÍODO PATRIARCAL

Instituir-se-ia o dízimo veterotestamentário quando Abraão (cf. Gênesis 14: 17-20), ao resgatar o seu sobrinho Ló e derrotar os seus inimigos, no episódio da matança dos reis, entregou a Melquisedeque, o “rei de Salém” e “sacerdote do Deus Altíssimo”, o dízimo dos despojos de guerra (não o fez para organizações e entidades eclesiásticas ou grupos, notadamente porque elas não existiam). Esse quadro é recontado pelo escritor do livro de Hebreus (Hb. 7: 1-10). Foi uma oferta voluntária, com apoio na gratidão; não na  culpa, na ameaça ou no medo. Não há, nesse texto bíblico veterotestamentário pré-legalista, ora sob comento, registros de “exigências” e “ordenanças”. Portanto, o desvio de finalidade veio posteriormente como uma heresia.

Em Betel, Jacó (cf. Gênesis 28:20-22), de igual forma voluntária, faz alusão, como um voto, à entrega do dízimo ao Senhor (o texto não respalda a entrega à organizações eclesiásticas), mercê da gratidão que expressava naquela ocasião de livramento e bênçãos que o Senhor lhe presenteava. Tanto no caso de Abraão, como no de Jacó não havia registro de ordenanças, diretas ou indiretas, com relação à entrega do dízimo, pelo que havia voluntariedade e espontaneidade do doador, em gratidão pelas bênçãos recebidas e vitórias conquistadas, em casos pontuais. Portanto, com base nos patriarcas, não se pode implantar na igreja uma regra doutrinária com o indisfarçável propósito de arrecadação financeira, a menos que ela seja voluntária; não dogmática, pois essa forma dogmática legalista Cristo já aboliu no Calvário. Senão vejamos.

“Porque o precedente mandamento é ab-rogado por causa da sua fraqueza e inutilidade, Pois a lei nenhuma coisa aperfeiçoa e desta sorte é introduzida uma melhor esperança, pela qual chegamos a Deus [...] de tanto melhor concerto Jesus foi feito fiador”.

(Hebreus 7: 18,19 e 22 )
E adiante assevera:

“Porque, repreendendo-os, lhes diz: Eis que virão dias, diz o Senhor, em que com a casa de Israel e com a casa de Judá estabelecerei um novo concerto. [...] Dizendo Novo Concerto, envelheceu o primeiro. Ora, o que foi tornado velho, e se envelhece, perto está de acabar”

(Hebreus 8:8 e 13)

DÍZIMO NO PERÍODO DA LEI

Com o advento da Lei, houve a instituição do dízimo, em confirmação ao período anterior, conforme se vê em Levítico 27: 30-32, texto no qual o Senhor Deus inaugura o dízimo sobre o produto do campo, da semente do campo, do fruto das árvores, de vacas e ovelhas, o que significa que o dízimo estava vinculado à criação (plantas e animais); não a valores econômicos. Outros dois textos respaldam o dízimo nesse período. Altamente significativo foi o que Moisés ordenou, com alicerce em revelação de Deus, indicando que os dízimos seriam endereçados à Tribo de Levi, aos levitas, pois eles não tinham possessão na terra (cf. Levítico 18:20). Portanto, já desconstrói, de pronto, a exigência de “obediência” a um pagamento feito para uma organização eclesiástica. Essa, aliás, nunca foi a finalidade bíblica do dízimo veterotestamentário.

Nessa quadra, é importante registrar – e muitos não sabem – que o Senhor determinou que os levitas não fossem desamparados (cf. Deuteronômio 12:19). Assim é que o dízimo era instituído para o sustento dos levitas, em razão da ausência de herança (mais uma vez, aqui, o dízimo não era canalizado para organizações humanas eclesiásticas, mas para uma tribo que se sustentava com o dízimo, porquanto não poderia ser diferente para aquela época). Instituir-se-ia como uma forma de compensação israelita, para aquele momento histórico. Em Números 18: 21 encontra-se registro confirmando: “E eis que aos filhos de Levi tenho dado todos os dízimos em Israel por herança, pelo seu ministério que exercem, o ministério da tenda da congregação”. Não se pode desviar essa finalidade bíblica para angariar “fundos eclesiásticos”.

Entanto, os levitas, por seu turno, dariam o “dízimo dos dízimos”, como oferta alçada ao Senhor. Nesse sentido veja o respectivo texto bíblico:

“Também falarás aos levitas, e dir-lhes-ás: Quando receberdes os dízimos dos filhos de Israel, que eu deles vos tenho dado em vossa herança, deles oferecereis uma oferta alçada ao Senhor; os dízimos dos dízimos. E contar-se-vos-á a vossa oferta alçada, como grão de eira, e como plenitude do lagar”.

(Números 18: 26-27)
O terceiro texto atinente ao dízimo, no período da Lei, se encontra no último livro do Pentateuco (cf. Deuteronômio 12: 5,6 e 11), com a instrução do Senhor para que Israel conduza os seus dízimos, isto é, ao lugar que o Senhor indicar, que será mais tarde conhecida como Jerusalém. Há menção de oferta de dízimos e administração dos levitas em II Crônicas 31: 6-15.

Sem embargo, tudo indica que havia um ano específico para a oferta do dízimo, pois o terceiro ano era chamado “ano do dízimo”. Assim é que o dízimo não era mensal (mais um argumento bíblico contrário à imposição eclesiástica atual). O que se nota, com bastante nitidez, era que o dízimo, ao contrário do que se vê atualmente, era usado para o sustento dos que não possuíam condições financeiras de sustento; não era usado para enriquecimento de sacerdotes, construções de tendas e templos, aplicações financeiras, investimentos imobiliários, viagens missionárias etc.. Nesse sentido, abra-se o Texto Sagrado em Deuteronômio. Veja abaixo:

“Quando acabares de dizimar todos os dízimos da tua novidade no ano terceiro, que é o ano dos dízimos, então os darás ao levita, ao estrangeiro, ao órfão e à viúva, para que comam dentro das tuas portas, e se fartem. E dirás perante o Senhor teu Deus: Tirei o que é consagrado de minha casa, e dei também ao levita, e ao estrangeiro, e ao órfão e à viúva, conforme a todos os teus mandamentos que me tens ordenado; nada transpassei dos teus mandamentos, nem deles me esqueci”.

(Deuteronômio 26: 12-13) 

Com efeito, o propósito do dízimo no Antigo Testamento era para atender às necessidades materiais dos levitas (registre-se: não existem mais levitas, nem eventuais “substitutos”), dos estrangeiros, dos órfãos e das viúvas, como expressão de gratidão ao Senhor, de modo que era distribuída uma décima parte aos necessitados, num reconhecimento de um princípio básico, segundo o qual o Senhor era Proprietário de todas as coisas, de toda a criação, de toda a criatura, porque Ele é o dono da prata e do ouro. No tempo da lei, esse grupo necessitado não tinha como se sustentar de forma que o preceito se tornou um mandamento para a época e Malaquias, que viveu por volta de 433 a.C., após o cativeiro babilônico, contemporâneo de Esdras e Neemias, exortou, de forma veemente, à entrega do dízimo para aquela época (cf. Malaquias 3: 8-12). Atualmente, há um desvio no desvirtuar do texto bíblico isolado. 

Em última análise deste tópico, necessário se faz entender o contexto histórico/cultural no qual Malaquias ordena a oferta do dízimo de forma incisiva, porquanto o “texto sem contexto é pretexto para heresias”. Nesse sentido, é interessante observar que, juntamente com II Crônicas 32: 5-12 e Neemias 12: 44-47, a finalidade para a qual Malaquias ordena a entrega do dízimo não deixa dúvidas: “Para que haja mantimentos na minha casa” (cf. Malaquias 3:10). A ordem foi bem específica. Portanto, era para a manutenção, de provisão, de comida, gêneros alimentícios na Casa do Senhor, naquele contexto histórico, diferentemente do atual; não mais que isso. Possuía nítido caráter de caridade. E aí está o grande equívoco, na ordenança dogmática sem contexto. De mais a mais, o texto bíblico de Malaquias rotulava de “roubadores” não aqueles que não davam o dízimo, mas aos que o recebiam e não repassavam aos levitas, estrangeiros, órfãos e viúvas. Outro equívoco encontrável amiúde. Uma vez mais cai por terra os argumentos falaciosos para angariar patrimônio.

Nos dias que correm o dízimo, como “imposição” e “obrigação” (“obrigação”?) do cristão teve a sua finalidade desvirtuada de sua origem, porquanto tem sido utilizado pelo líder ou cúpula das organizações eclesiásticas, sem o conhecimento claro dos membros e sem a devida prestação de contas, com direção para assalariar ou prover as despesas dos componentes da casta sacerdotal, para patrocinar viagens missionárias, construção de templos, investimentos imobiliários, aplicações financeiras e outros aparatos, bem como sustentar o luxo religioso, construção de grandes catedrais, desviando a real finalidade para a qual foi instituído o dízimo desde tempos imemoriais. Contudo, a par disso, o dízimo tomou novo formato com o advento da Graça.

Em toda investigação e em tudo se vê, no estudo do dízimo dentro da concepção veterotestamentária, que o conceito e o uso do dízimo, nesse período do Antigo Testamento, não se coadunam, a rigor, com a mentalidade atual, nas organizações religiosas, notadamente porque o dízimo nunca foi, nem será, dinheiro para os cofres das igrejas e/ou para enriquecer sacerdotes e organizações eclesiásticas, em desvio da sã doutrina. Seguidamente, o olhar investigativo se voltará para o panorama do Novo Testamento, no contexto do Cristianismo, dentro da releitura que o Senhor Jesus fez da Lei e dentro da Nova Aliança, da Graça Neotestamentária, numa investigação séria.

DÍZIMO NO PERÍODO DA GRAÇA NEOTESTAMENTÁRIA

De logo, verificar-se-á, sem sombras de dúvidas, da simples leitura do Novo Testamento, que não existe absolutamente nenhuma previsão bíblica normativa para o dízimo, dentro da Graça do Senhor Jesus. Não há, sob o ponto de vista mandamental, qualquer normatização para a oferta do dízimo, dito de melhor forma: O Senhor Jesus nunca, determinou a entrega do dízimo. Não há previsão doutrinária em Atos dos Apóstolos, no início da igreja primitiva; nem nas cartas/epístolas paulinas, nem nas demais cartas, nem no Apocalipse, orientação ou determinação para se entregar o dízimo.
Ainda nesse rumo de argumentação, indagar-se-á: em que texto do Novo Testamento existe preceitos para a cobrança ou a entrega dos dízimos? A pergunta ecoou sem resposta, porque não há. Então, as pouquíssimas alusões ao dízimo em o Novo Testamento serão analisadas aqui, não em textos e interpretações forçadas, tendenciosas e isoladas, mas no contexto, em conexidade com o espírito da época e com a ambiência na qual se tratou o assunto. Afinal, o erro está em não conhecer as Sagradas Escrituras.

Sob esse viés, o “ide e pregai” e “fazei discípulos”, com a finalidade ímpar da salvação, dentro do Pacto Sacrificial do Senhor Jesus, não incluía a arrecadação de dízimos, nem poderia (nem pode) ser, uma vez que não está no modelo bíblico neotestamentário. Por que, então, o desvio da sã doutrina, com imposição de fardos pesados para os membros das igrejas? É intuitiva a resposta, e bem fácil de entender! Nada impede que se faça uma coleta voluntária para a manutenção da organização religiosa, sem as características do dízimo.

O fazer o bem, em amor, não tem determinação temporal, contudo, a doutrina do medo, da chantagem para a imposição da cobrança de dízimos não encontra respaldo bíblico cristão. Vê-se que a imposição é seguida, em regra, de uma manipulação sugestiva, com a criação de um “sentimento de culpa” para que não haja “desobediência” e “infidelidade” na cobrança de dízimo. Nota-se que algumas organizações cobram explicitamente nos púlpitos; outras indiretamente, com “premiações/punições” para os “dizimistas”. Pedir ofertas não constitui desvio, mas impor o dogma do dízimo, ainda que indiretamente, sim. É uma heresia.

Ao contrário do que se apregoa por esses “brasis” de acertos e desacertos religiosos, as duas únicas vezes em que Cristo mencionou o dízimo foi dentro de um quadro de censura aos fariseus que guardavam a ordenança do dízimo, em legalismo ortodoxo, altamente censurado – diga-se uma vez mais – pelo Senhor Jesus, cujo comportamento, indubitavelmente, quebrou uma série de ordenanças ortodoxas legalistas e cerimoniais farisaicos. Aliás, os fariseus eram os mais fiéis dizimistas (diferentemente dos discípulos), segundo o texto mencionado, mas uma das características dos fariseus era a ausência de misericórdia e de perdão. Há notícias de algum discípulo entregando o dízimo? Há notícias de Jesus impondo o pagamento do dízimo? Eis os textos da fala de Jesus, em alusão aos dízimos.

“Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas! Pois que dizimais a hortelã, o endro e o cominho, e desprezais o mais importante da lei, o juízo, a misericórdia e a fé; deveis, porém, fazer estas coisas, e não omitir aquelas".

(Mateus 23:23) 

Agora, necessário se faz entender o contexto casuístico no qual o Senhor Jesus afirmou: “”deveis, porém, fazer estas coisas, e não omitir aquelas” (pois este pequeno trecho bíblico isolado constitui, na interpretação desvirtuada, argumento falacioso para a cobrança do dízimo), para não desvirtuar a interpretação genuína do texto dentro do contexto em que Se encontrava o Mestre, diante dos fariseus. Num primeiro momento, ficou claro que o Senhor, com uma certa ironia, sempre ordenava aos fariseus – e apenas a eles, pela hipocrisia – que cumprissem a lei, cujo teor eles tanto faziam questão de guardar. Essa ordenação o Senhor não repetia para os discípulos.

Jesus estava, em sua época, sob a lei, tanto que Gálatas 4:4, esclarece: “Mas, vindo a plenitude dos tempos, Deus enviou seu Filho, nascido de mulher, nascido sob a lei, Para remir os que estavam debaixo da lei, a fim de recebermos a adoção de filhos” (Gl. 4:4-5). Tanto que Ele foi circuncidado ao oitavo dia (nem por isso Ele estava ordenando que houvesse a circuncisão para os cristãos); foi apresentado na sinagoga dos judeus (nem por isso Ele estava ensinando que os cristãos deveriam ser apresentados na sinagoga judaica).

Quando Jesus curou um leproso, Ele ordenou que o curado apresentasse ao sacerdote “segundo a lei de Moisés” (nem por isso nas curas divinas o curado deve se ofertar as duas aves previstas em Levítico 14). Decerto, a lei era a “sombra dos bens futuros” (cf. Hebreus 10:1). Quem entender que o texto acima deve servir de argumento para a cobrança de dízimo, deve ofertar também duas pombinhas para cumprir a lei de Moisés, após a cura, pois Jesus teria “ordenado” (?). Tal não se dá, em leitura com bom discernimento.

Todavia, mais adiante, no mesmo capítulo, Paulo escreve: “Mas, agora, conhecendo a Deus, ou antes, sendo conhecidos de Deus, como tornais outra vez a esses rudimentos fracos e pobres, aos quais de novo quereis servir?” (Gl. 4:9). Portanto, Jesus cumpriu a lei pelo ser humano para implantar a Sua Graça Soberana, estabelecendo um Novo Pacto, dentro de uma Nova Aliança. Senão vejamos, nessa linha de raciocínio, o que disse o Senhor.

“Não cuideis que vim destruir a lei ou os profetas: não vim ab-rogar, mas cumprir. Porque em verdade vos digo que, até que o céu e a terra passem, nem um jota ou um til se omitirá da lei, sem que tudo seja cumprido.” 

Contudo, na cruz do Calvário, Jesus bradou: “Tudo está consumado” e o véu se rasgou de alto a baixo, estabelecendo um Novo Concerto com o Seu povo, a Igreja Corpo de Cristo. Tudo consumado, o quê? Ele cumpriu o rigorismo da lei, incluindo o dízimo, para estabelecer a Graça Maravilhosa, inaugurando o Evangelho da Salvação do Senhor em o Novo Testamento, sem os quais não alcançamos a salvação. Eis a tônica maior do Cristianismo.

Assim, dentre outros, Ele reformatou o dízimo que era uma ordenança da lei e apregoou o “Ano Aceitável do Senhor”, numa nova leitura da doação, estabelecendo as ofertas voluntárias, com amor. Não sem razão que o Senhor proclamou: “Um novo mandamento vos dou” (João 13:34). Portanto, para o Projeto de Salvação, o cristão não pode retroceder às ordenanças legalistas, menosprezando o sacrifício de Cristo. Provado está, por conseguinte, que o dogma do dízimo pertence à Lei; não ao Pacto da Graça do Novo Testamento.

Na sequência temática, observar-se-á que a segunda ocasião em que o Senhor Jesus mencionou o dízimo foi na parábola do fariseu e do publicano (Lucas 18: 9-14), censurando os “fiéis” dizimistas e os cobradores de dízimo, pois o que dava o dízimo, enfaticamente, era o lado errado da parábola, tal aquele soberbo que jejuava duas vezes por semana, embora o texto não mencione quais os dois dias semanais que o fariseu jejuava. A propósito, é possível saber quais eram esses dois dias semanais do jejum coletivo dos fariseus? (isso será palco para outro estudo bíblico). Eis o texto bíblico ora comentado, mencionando as características de um fariseu, sobretudo a soberba, pois quem não pertencesse à religião do fariseu não possuía a salvação, segundo a linha do fariseu. Por conseguinte, não havia elogio ao dizimista. Ao revés.

“Dois homens subiram ao templo, a orar; um fariseu, e o outro publicano. O fariseu, estando em pé, orava consigo desta maneira: Ó Deus, graças te dou, porque não sou como os demais homens, roubadores, injustos e adúlteros; nem ainda como este publicano. Jejuo duas vezes na semana, e dou os dízimos de tudo quanto possuo”.

(Lucas 18: 10-12)

Com cristalina clareza fica demonstrado nessa lógica da realidade bíblica – e Jesus ordenou: “Examinai as Escrituras [...]” (cf. João 5:39) – que o texto de Hebreus, de forma elucidativa e profunda apresenta a abolição completa do dízimo veterotestamentário, porque o sacerdócio levítico tinha ordens, segundo a lei, de receber, para aquela ocasião, os dízimos. Hoje, não mais. Pergunta-se: os sacerdotes de hoje receberam o sacerdócio levítico? O bom senso responde por si.

Quando o dogma veterotestamentário é “ressuscitado” em desconformidade com o Evangelho de Cristo, isto é sem o correspondente modelo bíblico neotestamentário, sempre culminará com desvios, mais cedo ou mais tarde, dentro do panorama cristão. E, afinal, conforme aqui amplamente demonstrado, não há qualquer fundamento bíblico em o Novo Testamento da Igreja Verdadeira de Cristo para a prática do dízimo. Senão vejamos em Hebreus 7:5,6, 8, 11 e 12.

“E os que dentre os filhos de Levi recebem o sacerdócio têm ordem, segundo a lei, de tomar o dízimo do povo, isto é, de seus irmãos, ainda que tenham saído dos lombos de Abraão. Mas aquele cuja genealogia não é contada entre eles tomou dízimos de Abraão, e abençoou o que tinha as promessas [...] E aqui certamente tomam dízimos homens que morrem: ali, porém, aquele de quem se testifica que vive.[...]. De sorte que, se a perfeição fosse pelo sacerdócio levítico (porque sob ele o povo recebeu a lei), que necessidade havia logo de que outro sacerdote se levantasse, segundo a ordem de Melquisedeque, e não fosse chamado segundo a ordem de Arão? Porque, mudando-se o sacerdócio, necessariamente se faz também mudança da lei.”

(Hb. 7: 5, 6, 8, 11 e 12)

Como se este tecido argumentativo bíblico não bastasse, o Senhor Jesus, perante os fariseus, “dizimistas fiéis”, proclamou que a lei e os profetas duraram até João. Portanto, dentro desta perspectiva, os que pregam o dízimo, na realidade, estão, a rigor, negando indiretamente o sacrifício de Cristo, uma vez que os que assim procedem morrem, realizam obra morta, isto é, sem a Graça de Cristo (conforme o versículo oito do capítulo sete do livro de Hebreus) e oprimem o cristão. Veja abaixo o texto de Lucas, em sintonia com o que ora se afirmou:

“E os fariseus, que eram avarentos, ouviam todas as coisas, e zombavam dele. E disse-lhes: Vós sois os que vos justificai a vós mesmos diante dos homens, mas Deus conhece os vossos corações, porque, o que entre os homens é elevado, perante Deus é abominação. A lei e os profetas duraram até João; desde então é anunciado o reino de Deus, e todo o homem emprega força para entrar nele”.

(Lucas 16: 14-16)

Ora bem, quem defende o dogma do dízimo, cuja previsão está na Lei de Moisés, deveria, na mesma linha, defender a circuncisão, o apedrejamento literal de adúlteros, o sacrifício de animais, a queima do incenso, a guarda literal do sábado e outras ordenanças veterotestamentárias, pois quem tropeça em um til da lei dela se faz transgressor. Afinal, Deus não ofertou apenas os dez mandamento; havia uma série no Antigo Testamento. Então, por que, curiosamente, só se cumpre na lei o dízimo? Ou reconstruiremos a ruptura do véu rasgado na ocasião da morte vicária cristológica? Soa, no mínimo despropositado e transmite uma ideia suspeita de interesses não espirituais.
Nesse sentido, Tiago ao registrar, enfaticamente, em seu capítulo 2:10, resta indubitável a clareza do texto “Porque qualquer que guardar toda a lei, e tropeçar em um só ponto, tornou-se culpado de todos”. Para cumprir a lei integralmente o guardador literal do sábado deveria apedrejar quem não o fizesse, pois se ele guarda o sábado e não apedreja quem não guarda, ele fere a lei mosaica (a lei é clara quanto ao apedrejamento), tropeçando num til da lei. Dir-se-ia: o “apedrejamento” é simbólico. Logo, a guarda do sábado também é simbólica.

É verdade que muitos ignoram a divisão testamentária, confundindo a Lei com a Graça. Tal não se deve dar, entretanto. Deveras, a Nova Aliança não teve como marco inicial o nascimento de Jesus, razão pela qual Ele cumpriu a Lei, mas foi a morte e a Sua ressurreição, como o Seu triunfo na cruz, que introduziu o Novo Testamento. No intuito de arrematar o que se disse acima, é interessante a transcrição de alguns versículos bíblicos que confirmam a linha teológica ora defendida.

“Por isso nenhuma carne será justificada diante dele pelas obras da lei, porque pela lei vem o conhecimento do pecado. Mas agora se manifestou sem a lei a justiça de Deus, tendo o testemunho da lei e dos profetas”.

(Romanos 3: 20-21)

“Porque o pecado não terá domínio sobre vós, pois não estais debaixo da lei, mas debaixo da graça”

(Romanos 6:14)

“Sabendo que o homem não é justificado pelas obras da lei, mas pela fé em Jesus Cristo, temos também crido em Jesus Cristo, para sermos justificados pela fé de Cristo, e não pelas obras da lei; porquanto pelas obras da lei nenhuma carne será justificada [...] Porque, se torno a edificar aquilo que destruí, constituo-me a mim mesmo transgressor. Porque eu pela lei estou morto para lei, para viver com Deus”.

(Gálatas 2: 16, 18 e 19)

“Fostes comprados por bom preço; não vos façais servos dos homens”.

(I Coríntios 7:23)

“Porque toda a lei se cumpre numa só palavra, nesta; Amarás ao teu próximo como a ti mesmo”.

(Gálatas 5: 14)
“Na sua carne desfez a inimizade, isto é, a lei dos mandamentos, que consistia em ordenanças, para criar em si mesmo dos dois um novo homem, fazendo a paz.”

(Efésios 3: 15)

Dir-se-ia, absurdamente, com sustentáculo em Atos, que Ananias e Safira morreram porque não teriam “pago o dízimo”. Dir-lhe-ei, entrementes: o texto é claro ao afirmar que morreram porque mentiram ao Senhor, acerca do valor da venda de uma propriedade na ocasião em que havia a distribuição de bens no início da igreja primitiva, pois toda a comunidade eclesiástica distribuía o que lhe era comum e eles retiveram parte do preço naquele contexto histórico, mas não se tratava de dízimos, mas de ofertas aos necessitados. Em nenhum instante se cogita de “dízimos”. Portanto, não se aplica o referido texto. Basta ler o texto bíblico, em Atos 5: 1-5.

Decerto, o episódio da viúva pobre observada pelo Senhor Jesus, cujo teor é narrado em Lucas 21: 1-4, diz respeito à oferta alçada, a única vinculada a dinheiro. Contudo, ainda que se quisesse entender que se tratava de dízimo, ainda não havia sido estabelecido o Novo Testamento porque Jesus não havia morrido e ressuscitado dentre os mortos em triunfo inigualável sobre a morte e o pecado. Portanto, o texto não oferece respaldo para o “mito” do dízimo.

O que se vem a dizer é que a Graça Neotestamentária, após a morte vicária do Messias, dentre outros efeitos, substituiu o dízimo (valor “obrigatório” de dez por cento) pela oferta voluntária segundo o coração do ofertante, conforme se vê numa das cartas paulinas (Paulo alcançou e entendeu o redimensionamento da contribuição espontânea), associando a oferta à Graça, tanto que o texto abaixo diz da oferta “com alegria”. Esse ponto argumentativo é altamente significativo. Senão vejamos abaixo:

“E digo isto: Que o que semeia pouco, pouco também ceifará; e o que semeia em abundância, em abundância também ceifará. Cada um contribua segundo propôs no seu coração; não com tristeza ou por necessidade; porque Deus ama ao que dá com alegria. E Deus é poderoso para fazer abundar em vós toda a graça, a fim de que tendo sempre, em tudo, toda a suficiência, abundeis em toda a boa obra. Conforme está escrito: Espalhou, deu aos pobres: a sua justiça permanece para sempre”

(II Coríntios 9: 6-9)

Ora bem, se a contribuição, segundo Paulo, é “segundo propôs no seu coração”, logo não há obrigação do dízimo (10%). Ponto alto e emblemático a ser destacado – conquanto pouco entendido – no texto acima transcrito é o endereçamento da oferta. Tanto pode ser direcionada para organizações eclesiásticas como pode ser endereçada “para os pobres”, se o ofertante assim o desejar ou entender. Dito de melhor forma: se Deus assim o colocar em seu coração, ou entender que a organização não necessita ou nela o ofertante não confia para a administração da oferta (cf. v. 9), o doador poderá empregar a sua oferta diretamente aos necessitados e terá cumprido o mandamento neotestamentário.

Isso faz muito sentido, porque a oferta é endereçada ao Senhor (não a organizações, conforme prega a maioria delas) e o próprio Senhor autorizou a “repassar” para os “pequeninos irmãos”. Isso está na Bíblia, mas com teor de voluntariedade. De mais a mais, o repasse direto aos necessitados não criaria, a rigor, sentimentos de ciúmes e contendas entre as organizações eclesiásticas ávidas pela arrecadação, fruto da fé dos fiéis. Corroborando esta tese está o texto encontrado em Mateus 25. Veja aqui.

“Então os justos lhe responderão, dizendo: Senhor, quando te vimos com fome, e te demos de comer? ou com sede, e te demos de beber? E quando te vimos estrangeiro, e te hospedamos? ou nu, e te vestimos? E quando te vimos enfermo, ou na prisão, e fomos ver-te? E, respondendo o Rei, lhes dirás: Em verdade vos digo que, quando o fizestes a um destes meus pequeninos irmãos, a mim o fizestes.”

(Mateus 25: 37-40) 

Todavia, haverá situações nas quais o ofertante passa por tribulações financeiras e não poderá ofertar um valor maior, ou o percentual rígido e legalista de “dez por cento”, o que fazer? Assim responde o conselho de Paulo, conforme texto neotestamentário a seguir transcrito. Aliás, essa recomendação de Paulo justifica o destino da oferta com mais propriedade para os irmãos do que para organizações religiosas, de sorte que ofertando aos irmãos, o ofertante cumprirá o preceito bíblico da oferta e o Senhor o recompensará, conforme aqui fartamente fundamentado, à luz da Palavra de Deus.

“Agora, porém, completai também o já começado, para que, assim como houve a prontidão de vontade, haja também o cumprimento, segundo que tendes. Porque, se há prontidão de vontade, será aceita segundo o que qualquer tem, e não segundo o que não tem. Mas, não digo isto para que os que outros tenham alívio, e vós opressão, mas para igualdade; neste tempo presente, a vossa abundância supra a falta dos outros, para que também a sua abundância supra a vossa falta, e haja igualdade.”

(II Coríntios 8: 11-14)

Com relação à periodicidade da oferta (não do “dízimo”), o Novo Testamento se omite, deixando para o “livre arbítrio” concedido por Deus. Recomendável – mas não mandamental – que fosse mensal, por uma questão de necessidade e de bom senso, mas nada impede que Deus coloque outra diretriz no coração do ofertante ou que ele entenda que deva ser com alternativas que não pese para si, podendo ser algumas vezes por ano. Nessa linha de ideias é que se percebe que o restabelecimento do dogma do dízimo veterotestamentário tão cultivado pelos fariseus era de cunho tradicional, conforme registrado em Marcos 7:13 “Invalidando assim a palavra de Deus pela vossa tradição, que vós ordenastes. E muitas coisas fazeis semelhantes a estas”. Não há dúvidas!

Dir-se-ia, sem respaldo bíblico que o percentual de “dez por cento”, oriundo da lei deve ser aplicado no período da igreja neotestamentária. Vai dizer Paulo, de forma diferente na primeira carta que escreveu aos coríntios. Segue abaixo, derrubando, de vez, por terra esse argumento. Não há como pensar o contrário, a menos que se queira obedecer aos preceitos humanos meramente religiosos oriundos de normatizações humanas antiescriturísticas.

“Ora, quanto à coleta que se faz para os santos, fazei vós também o mesmo que ordenei às igrejas da Galácia. No primeiro dia da semana cada um de vós ponha de parte o que puder ajuntar, conforme a sua prosperidade, para que se não façam as coletas quando eu chegar.”

(I Coríntios 16: 1-2)

Com efeito, o texto acima, guardando as suas devidas proporções, está em conexidade com o escrito de Lucas, em Atos dos Apóstolos em seu capitulo 2:45 “E vendiam suas propriedades e fazendas, e repartiam com todos, segundo cada um havia de mister.”

Sob esse viés, a oferta é um ato que está vinculado ao mandamento central expresso pelo Senhor Jesus, tal seja: o amor. Quem são os beneficiados com a oferta doada espontaneamente? Deveras, a Palavra de Deus tem resposta para todas as indagações humanas. Vai dizer Paulo escrevendo aos gálatas, ensinando que devemos fazer bem a todos, mas “principalmente aos domésticos da fé”, de sorte que devemos socorrer aos irmãos em Cristo, mas isso não impede de socorrermos aos demais.

“E não nos cansemos de fazer bem, porque a seu tempo ceifaremos, se não houvermos desfalecido. Então, enquanto temos tempo, façamos bem a todos, mas principalmente aos domésticos da fé.”
(Gálatas 6:9-10)

O que tem sido observado, quanto ao modo de ofertar, é que o ofertante, não raro, toca trombeta, dizendo das doações que fez aos pobres e às organizações religiosas, rememorando aquilo que fez para a sua glória terrena. Esse comportamento traz a lume o antigo – mas sempre novo – ensinamento de Cristo, encontrado em Mateus, consoante transcrito abaixo.

“Quando pois deres esmolas, não faças tocar trombeta diante de ti, como fazem os hipócritas nas sinagogas e nas ruas, para serem glorificados pelos homens. Em verdade vos digo que já receberam o seu galardão. Mas, quando tu deres esmolas, não saiba a tua mão esquerda o que faz a tua direita. Para que a tua esmola seja dada ocultamente: e teu Pai, que vê em segredo, te recompensará publicamente.”

(Mateus 6: 2-4)

Nessa ordem de reflexão concernente ao dízimo, em sintonia com as Escrituras Sagradas, é muito comum, na cotidianidade, as organizações eclesiásticas, por seus dirigentes e líderes religiosos, tecerem um conjunto sistematizado de indutivas argumentações por meio do qual os seus membros são levados a criarem um complexo de culpa imaginário no qual acreditam que se não pagarem o dízimo veterotestamentário estarão “devendo” dinheiro a Deus, razão pela qual estão suscetíveis de empobrecer, como “vingança divina”. Isso não tem, obviamente, respaldo bíblico neotestamentário, conforme aqui amplamente demonstrado e se constitui absurdo do ponto de vista bíblico. Faz parte de um forte mecanismo manipulador de arrecadação para os seus cofres e tem origem na igreja medieval. É bom que se esclareça.

Mas não é só. Quando esse mecanismo é sustentado pelo elemento “fé”, pois, nessa tese falaciosa, “quem não paga não tem fé”, induz a arrecadação de modo inquestionável, mercê do temor que é plantado na mente do cristão. Não raro os defensores do dízimo possuem interesse financeiro nessa doutrina. Curiosamente, nessa sustentação veemente, em regra, subjaz escondida a ideia subliminar de arrecadação para a organização ou para o seu dirigente.

Se se entendesse que a provisão divina pudesse ser “comprada” pelo pagamento do “dízimo”, naquele conhecido “tome lá, dá cá”, anular-se-ia a Graça como favor imerecido. Com efeito, Deus não negocia com o ser humano, porque a bondade de Deus, inerente a um de Seus atributos, não depende da “bondade” humana. Em Cristo temos novas todas as coisas, pois que as coisas velhas já se passaram. Tudo se fez novo, sem constrangimentos, em liberdade e alegria de servir ao Senhor dos Exércitos.

E, para quem gosta de experiências, finalizo esta incursão com uma pessoal: o escritor deste singelo artigo bíblico entregava o dízimo a uma organização eclesiástica financeiramente bem estruturada, durante mais de vinte anos, período após o qual, com uma pesquisa mais aprofundada nas Sagradas Escrituras, Deus concedeu nova direção, de maneira que cessou a entrega do dízimo, substituindo pela oferta aos necessitados e para alguns grupos que necessitavam de ajuda, mas não o percentual tradicional. Interessante que durante aqueles vinte anos, este antigo dizimista sempre e inexplicavelmente, ultrapassava o “cheque especial”, no “sufoco”. Após a nova mentalidade, com a alteração de paradigma, como um sinal confirmando a veracidade deste estudo, após dois meses com a nova sistemática, o Órgão Pagador deste escritor, anunciou que a partir de então pagaria uma quantia atrasada em diversas parcelas mensais, proporcionando uma bênção material, motivo de glorificação a Deus pela confirmação da veracidade deste estudo.


Em tom de conclusão, e como resultado de uma hermenêutica bíblica séria, forçoso é convir que o dogma legalista do dízimo implantado no Antigo Testamento foi reformatado/redimensionado por Cristo, encarnação da Graça Divina, em o Novo Testamento, numa releitura liberta, de maneira que as ofertas voluntárias, em amor, tomaram lugar na Nova Aliança, sem a obrigatoriedade de outrora. Isso leva o cristão ao exercício do amor em doação até aquele Grande Dia em que o Senhor vier buscar a Sua Igreja Essencial. Deus abençoe o amigo leitor.

Fonte literária: : "Em Busca da Essência Bíblica"
Editora All Print. 
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