A CARNALIDADE PARTIDÁRIA E A SERVIDÃO VOLUNTÁRIA
Por Daniel Santos
"Porque,
dizendo um: Eu sou de Paulo; e outro: Eu de Apolo; porventura não sois
carnais?" 1 Coríntios 3:4
Gostaria de iniciar
esta breve consideração concordando com um grande humanista francês por nome de
Étienne de La Boétie que disse: "É natural no homem o ser livre e o querer
sê-lo; mas está igualmente na sua natureza ficar com certos hábitos que a
educação lhe dá. Diga-se, pois, que acaba por ser natural tudo o que o homem
obtém pela educação e pelo costume; mas da essência da sua natureza é o que lhe
vem da mesma natureza pura e não alterada; assim, a primeira razão da servidão
voluntária é o hábito: provam-no os cavalos sem rabo que no princípio mordem o
freio e acabam depois por brincar com ele; e os mesmos que se rebelavam contra a
sela acabam por aceitar a albarda e usam muito ufanos e vaidosos os arreios que
os apertam.
Afirmam que sempre
viveram na sujeição, que já os pais assim tinham vivido. Pensam que são
obrigados a usar freio, provam-no com exemplos e com o fato de há muito serem
propriedade daqueles que os tiranizam" (LA BOÉTIE, 2006, p. 29).
Seríamos injustos
em dizermos que o hábito da servidão voluntária é algo novo na história da
igreja.
Quando a
subserviência religiosa se intensifica, é porque o proprietário se camufla de tal
modo que os seus serviçais são "misticamente" levados a acreditar que
estão a serviço do Reino de Deus. A pergunta que não quer calar é: Deus age
mesmo assim?
A graça de Deus nos
alcança e nos tolera na medida da nossa sinceridade. Escravos ou libertos, Ele nos ama. É
por isso que quando o indivíduo busca o conhecimento, raramente ele permanece nos "acordos".
Estamos
presenciando hoje grandes reviravoltas nos "impérios da fé". Muitos
donos de religião estão sofrendo com a perda de seus colaboradores; e com a
proliferação de novos ministérios (ex-colaboradores) torna-se mais difícil
segurar os seus "fiéis".
Os motivos dos
desligamentos são os mais variados; temos "os explorados", que
perderam parte de suas vidas abastecendo uma filial em suas cidades; "os
protestantes", que se negam obedecer às novas adaptações exegéticas;
"os microempreendedores", que levam parte da clientela para os seus
redis; "os oportunistas" que enriqueceram nos sistemas, e agora
entendem que podem arranhar o seu patrimônio se continuarem alienados e a lista
segue.
Infelizmente a
grande massa nem sabe bem o porquê do seu desligamento; pois larga-se um dono e
desmaia nos braços de outro.
Paulo nos convida a
nos desfazer da carnalidade, isto é, Paulo, Apolo ou Cefas são apenas conjuntos
de conceitos que estão sujeitos às mudanças a qualquer momento.
Outro ponto
importante a se trabalhar é a respeito dos que perseveram alienados aos
sistemas que estão a deriva. O que segura estes?
Os motivos, repito:
são os mais variados.
Temos que ser
imparciais e olhar por todos os ângulos possíveis. A minha preocupação aqui é
destacar apenas dois grupos: os conformados, que temem perder a sua salvação
devido a sacralização da instituição e os deformados, que temem em perder a
glória e as regalias que a sua posição clerical permite.
Levando-se em
consideração esses aspectos, o princípio que Paulo nos leva é: ser
propriedade de alguém é quando esse alguém é alvo de nossa total obediência. A
obediência que não questiona, Paulo a chama de carnalidade. Ser de Cristo é
tê-lo como O Filtro de tudo que vemos e ouvimos.
Fonte: Discurso Sobre a
Servidão Voluntária (1549)
Título original
Discours de la servitude
volontaire
Étienne de La Boétie
(1530-1563)
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